sexta-feira, 20 de março de 2009

Culinária, o tempo e o relógio


Sempre que vamos à cozinha dispostos a preparar algo, nos munimos de receitas. Quero dizer, nem sempre. Mas vamos considerar as vezes que seguimos uma receita. Um dos aspectos deste ‘manual de fazer comida’ é o tempo para executar cada etapa da preparação, certo?

Pois é exatamente sobre isso que quero ‘falar’. Quando incorporamos as receitas à nossa memória pessoal, passamos a decorar o tempo de cada coisa, pela forma, pela cor, pela textura, pelo cheiro que apresenta etc.

Isso significa que culinária exige grande sensibilidade. É isso não é uma descoberta minha, com certeza.

Mas a reflexão é a seguinte: com esta sensibilidade aguçada, passamos a perceber mais detalhada e intensivamente o que nos rodeia, despertamos nossos sentidos para desfrutar do que aí está.

E isso nos faz pensar que o relógio como co-adjuvante de nossa vida moderna reduz nossas habilidades e nossa sensibilidade e unifica o ritmo de cada um, além claro de nos tornar frios e, muitas vezes, insensíveis. Quando a receita diz, asse por 40 min em forno a 180º, supostamente não precisamos nos preocupar com os cheiros, cores ou barulhos que venham a ocorrer.

Presos ao relógio, não respeitamos nosso tempo de viver cada momento e nos defrontamos com a necessidade de racionalizar instantes que são pura sensibilidade. E nos distanciamos da verdade mais autêntica de todas que é a nossa própria, sem comparações, sem julgamentos. Delegamos a uma máquina a função e o direito de controlar as nossas vidas e fazer delas um meio de legitimar a produtividade industrial, e criamos e usamos esta máquina no afã de viver mais em menos tempo de vida. Ou seja, otimizar o tempo que temos, mas negligenciar o nosso real aproveitamento.

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